
Entrevista com Dr. Nacib da Luz Camargo Júnior, coordenador da Ortopedia do Conjunto Hospitalar do Mandaqui
REPORTAGEM ESPECIAL – REDAÇÃO DA SÃO PAULO TV FIM DE SEMANA por Beatriz Ciglioni

Tema: Acidentes com motociclistas e os impactos na saúde pública
O Hospital do Mandaqui é hoje o maior hospital de administração direta do Estado de São Paulo. Referência em atendimento de traumas, especialmente para toda a zona norte da capital, a instituição vem observando um dado alarmante: o alto índice de fraturas causadas por acidentes com motocicletas. Para entender melhor esse cenário, a São Paulo TV entrevistou o Dr. Nacib da Luz Camargo Júnior, ortopedista e coordenador da especialidade no hospital.
SPTV: Dr. Nacib, qual é a dimensão dos atendimentos relacionados a acidentes de moto no Hospital do Mandaqui?
Dr. Nacib da Luz Camargo Júnior: Hoje, os acidentes com motocicletas representam cerca de 10% de todas as fraturas que atendemos no hospital. É um número significativo, especialmente se considerarmos a complexidade desses casos. Mais preocupante ainda é que, entre as fraturas expostas — aquelas em que o osso atravessa a pele —, 90% são causadas por acidentes com motociclistas.
SPTV: E qual o tipo de fratura mais comum nesses casos?
Dr. Nacib: As fraturas expostas mais comuns atingem a perna, especialmente os ossos da tíbia e da fíbula. Cerca de 70% das fraturas expostas que tratamos envolvem esses dois ossos. Isso se deve à posição vulnerável das pernas durante a condução da motocicleta, ficando praticamente desprotegidas em uma colisão ou queda.
SPTV: Existe um perfil predominante entre os pacientes que chegam ao hospital com esse tipo de trauma?
Dr. Nacib: Sim. A maioria dos pacientes é composta por jovens adultos, com uma média de idade em torno de 32 anos. São pessoas em plena fase produtiva da vida. Isso agrava ainda mais o problema, porque além do sofrimento físico, esses acidentes impactam diretamente a renda familiar, o tempo de recuperação, e até mesmo a reinserção no mercado de trabalho.
SPTV: Como o senhor compara o tratamento de uma fratura exposta com uma fratura fechada?
Dr. Nacib: A fratura exposta é sempre mais grave. O risco de infecção em uma fratura fechada gira em torno de 1%, mas nas fraturas expostas esse número pode chegar a 16%. Isso significa que o paciente precisa de um cuidado intensivo, internações prolongadas e, muitas vezes, passa por mais de uma cirurgia. É uma situação que gera sofrimento para o paciente e grande custo para o sistema de saúde.
SPTV: Diante desse cenário, que medidas de prevenção o senhor considera viáveis?
Dr. Nacib: Acredito que precisamos avançar no debate sobre a obrigatoriedade do uso de equipamentos de proteção para os membros inferiores dos motociclistas. Uma solução prática e eficaz seria a exigência de protetores de perna — como caneleiras rígidas externas —, que além de protegerem contra fraturas, são fáceis de fiscalizar pelas autoridades de trânsito. Outra alternativa, que já vem sendo utilizada por alguns motociclistas, é o chamado “mata-cachorro”, uma estrutura metálica instalada na lateral da moto, que reduz o impacto direto nas pernas em caso de queda.
SPTV: Essas soluções seriam economicamente viáveis e facilmente aplicáveis?
Dr. Nacib: Sim, com certeza. São medidas simples, de baixo custo, que podem salvar vidas ou ao menos reduzir significativamente o risco de fraturas graves. Com isso, evitamos internações longas, múltiplas cirurgias, sequelas irreversíveis e, claro, ajudamos a preservar a dignidade das pessoas. É um investimento preventivo com retorno direto na qualidade de vida dos cidadãos e na economia dos recursos públicos.
SPTV: Como o Hospital do Mandaqui se posiciona diante desse desafio?
Dr. Nacib: Seguimos firmes na linha de frente do trauma, com equipes especializadas, protocolos bem estruturados e foco na excelência do atendimento. Mas é fundamental que a prevenção caminhe lado a lado. O hospital está pronto para cuidar, mas a sociedade precisa atuar para evitar que essas situações se tornem rotina. A saúde pública começa com consciência no trânsito.
SPTV: O senhor gostaria de deixar uma mensagem final?
Dr. Nacib: Sim. Cada motociclista que atendemos no Mandaqui é alguém que teve seu cotidiano interrompido de forma abrupta. Ninguém sai ileso de um trauma grave. A prevenção é a chave. Usar os equipamentos de segurança adequados, respeitar as leis de trânsito e pensar no amanhã são atitudes que salvam vidas. E se pudermos implementar medidas simples com apoio das autoridades, como as proteções que citei, podemos evitar muitas tragédias.
ENTREVISTADO
Dr. Nacib da Luz Camargo Júnior
Coordenador da Ortopedia do Conjunto Hospitalar do Mandaqui
CRM-SP 111.675 | TEOT 10.756
REPORTAGEM: Redação São Paulo TV
Edição e Produção: São Paulo TV Broadcasting