
Comissão criada pela OAB-SP debate propostas para a reforma do Judiciário
Da redação da São Paulo Tv Bene Correa Com informações do Estadão e UOL
A comissão de estudos criada pela seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) para debater uma reforma ampla do Poder Judiciário se reuniu pela primeira vez nesta segunda-feira (23). Neste primeiro encontro, os participantes tinham como objetivo definir um cronograma de reuniões de trabalho.
A ideia é debater propostas de mudanças e apresentá-las, provavelmente daqui um ano, ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal.
A comissão quer colocar em discussão temas que hoje já estão no radar dos críticos à atuação do Poder Judiciário, como o funcionamento do STF, a conduta dos ministros e a própria administração da Justiça.
Na primeira reunião, os integrantes da comissão apresentaram suas principais preocupações e a crise de credibilidade do Poder Judiciário foi destacada por todos.
Ellen Gracie, a primeira mulher a ocupar uma vaga no Supremo Tribunal Federal, entre os anos de 2000 e 2011, e a presidir a Corte, entre 2006 e 2018, integra a comissão de trabalho e defendeu a busca de propostas para a reforma.
- “O momento é exatamente adequado para que nós trabalhemos sobre esse tema porque o Judiciário se encontra sob crítica violenta de todos os lados. Não consegue agradar a ninguém”, afirmou a ministra.
Atribuições do STF
O ex-ministro da Justiça Miguel Reale Jr. também está na comissão. Na opinião dele, o STF é um dos objetos de “preocupação” do grupo de trabalho. - “Seja com relação à sua competência, seja com relação ao seu regimento interno, seja com relação à sua imagem. Para a preservação de sua imagem como um órgão neutro, imparcial e íntegro”, afirmou o ex-ministro.
A cientista política Maria Tereza Sadek concorda com as críticas ao Judiciário e citou como exemplo a atuação de ministros e juízes. - “Nós temos que reconhecer que vivemos difíceis, momentos de crise, em que o Judiciário tem sido atacado por vários setores da população. É nosso dever tentar fazer uma reflexão séria e consistente sobre a situação atual”, afirmou a professora e pesquisadora.
Entre as propostas apresentadas para debte está a criação de um código de conduta para magistrados, inclusive ministros de tribunais superiores, com regras claras de imparcialidade.
Hoje, juízes, desembargadores e ministros seguem as normas previstas na Lei Orgânica da Magistratura (Loman), o estatuto dos magistrados, em vigor desde 1979, quando o país era comandando pelo presidente João Figueiredo, o último general a presidir o país na ditadura militar, portanto antes da promulgação da Constituição Federal.
Transmissões das sessões do STF
Outra proposta que começou a ser debatida é a restrição da transmissão ao vivo das sessões plenárias do STF. Estudos mostram que o tempo de voto dos ministros aumentou sensivelmente desde a criação da TV Justiça.
A comissão avalia propor que apenas julgamentos de questões constitucionais continuem a ser transmitidos em tempo real. Nesse caso, ações criminais, por exemplo, como os processos da trama golpista, poderiam ser acompanhadas apenas presencialmente.
Outras ideias na mesa são a proposta de mandato para ministros do STF, como ocorre em países da Europa, como Itália, França, Alemanha, Espanha e Portugal, e a redução da competência criminal da Corte.
A comissão deverá ser um espaço para debater reformas no Judiciário, porém há uma preocupação em se contrapor a iniciativas consideradas revanchistas contra o STF, como projetos de lei de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para restringir prerrogativas dos ministros.
De acordo com o professor Oscar Vilhena, da FGV, “é uma comissão a favor da Justiça, não é uma comissão contra a Justiça, mas é uma comissão crítica”.
No ano passado, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou um pacote de medidas para alterar o funcionamento do STF. Uma das propostas era a revisão de julgamentos pelo Poder Legislativo. No entanto, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), engavetou o assunto.
O critério para escolha dos membros da comissão da OAB foi a pluralidade. Além de juristas, há ministros aposentados do STF e ex-ministros de Estado que participaram dos governos FHC, Lula e Dilma.
Foro privilegiado
A restrição do foro privilegiado está entre os temas delicados que serão discutidos pelo grupo de trabalho. - “O Supremo Tribunal Federal alargou muito a competência dele nos últimos anos, o que visivelmente está fazendo mal ao tribunal, seja pela carga de trabalho, seja pela politização. Um tribunal que julga políticos, e o Supremo julga políticos em excesso, acaba se politizando naturalmente”, afirma o presidente da OAB de São Paulo, Leonardo Sica, um dos responsáveis pela iniciativa.
Sica defende ainda que o Judiciário não pode ser “governado por normas de gabinete”, em referência aos atos normativos editados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como o que restringiu as sustentações orais dos advogados, um dos pontos de atenção da comissão. - “Os juízes não têm o monopólio de administrar a Justiça. Essa é uma tarefa que tem que ser compartilhada com a sociedade”, afirma o presidente da OAB de São Paulo.
A comissão também deve debater as punições administrativas possíveis para os magistrados. Atualmente, a sanção disciplinar mais dura para juízes envolvidos em desvios éticos é a aposentadoria compulsória com vencimentos. - “É algo que choca o senso comum da população e tem que ser revisto. Acho que pode ser debatido em consenso com a magistratura”, afirma Sica.
No entanto, um tema polêmico e caro aos magistrados deve ficar fora de discussão: os penduricalhos e supersalários de juízes. Pelo menos, por enquanto, não está previsto que os salários dos magistrados seja alvo de discussão no grupo de trabalho.
Vale lembrar que o governo tenta aprovar a PEC do corte de gastos propostas para pôr fim às remunerações acima do teto dos magistrados, mas enfrenta forte reação da categoria.
Veja quem compõe a Comissão de Estudos para a Reforma do Judiciário da OAB de São Paulo:
Alessandra Benedito, professora de Direito da FGV
Cezar Britto, ex-presidente da OAB
Cezar Peluso, ex-presidente do STF
Ellen Gracie, ex-presidente do STF
José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça
Maria Tereza Sadek, cientista política
Miguel Reale Jr., ex-ministro da Justiça
Oscar Vilhena, professor de Direito da FGV
Patricia Vanzolini, ex-presidente da OAB de São Paulo