
O Brasil investe, mas ainda falha em transformar acesso em aprendizagem de qualidade
📺 São Paulo TV | Opinião Por João Cury – Deputado Federal (MDB-SP)
A divulgação do relatório internacional Education at a Glance 2025, produzido pela OCDE em parceria com o Inep, reacendeu um debate que não podemos mais adiar: o Brasil avançou em ampliar o acesso à educação, mas ainda falha em transformar esse acesso em aprendizagem de qualidade.

Os números parecem animadores à primeira vista. O país investe 4,4% do PIB em educação, proporção próxima à média da OCDE. Entre 2013 e 2023, a matrícula em creches subiu de 28% para 40%, e o ensino superior ultrapassou a marca de 10,2 milhões de estudantes. Mas a realidade por trás dessas estatísticas revela contradições profundas.
Nas universidades públicas, a média é de 10 alunos por professor, enquanto nas privadas chega a 62, reflexo da expansão acelerada do ensino a distância. Mais de 70% das matrículas em licenciaturas privadas já são EaD, o que significa que estamos formando futuros professores em condições que comprometem a qualidade do ensino que oferecerão. Formamos diplomas, mas não garantimos formação sólida.
Na educação básica, o cenário também é preocupante. O Ideb de 2023 mostrou 6,0 pontos nos anos iniciais do fundamental, mas apenas 4,7 nos anos finais e 4,1 no ensino médio. Em muitos casos, a melhora não veio da aprendizagem, mas da redução da reprovação. Ou seja, os estudantes permanecem na escola, mas chegam ao ensino médio sem dominar conteúdos essenciais de leitura e matemática.
O Censo Escolar 2024 reforça esse diagnóstico. O Brasil registrou 47,1 milhões de matrículas, mas com queda de 216 mil em relação a 2023, puxada pela rede pública. A Educação de Jovens e Adultos (EJA) segue em retração, e hoje temos 8,7 milhões de jovens entre 14 e 29 anos que não concluíram o ensino médio. É uma bomba social silenciosa que ameaça a inclusão e o desenvolvimento do país.

A desigualdade racial e social agrava o problema. O IBGE mostrou que ainda temos 9,1 milhões de analfabetos (5,3% da população com 15 anos ou mais). Entre idosos brancos, a taxa é de 8,1%, mas entre pretos e pardos dispara para 21,8%. Em média, brancos têm 11 anos de estudo, enquanto pretos e pardos ficam em 9,4 anos. No ensino médio, a taxa de conclusão de estudantes brancos é até dez pontos percentuais superior à de estudantes negros e indígenas. Essa disparidade revela que não existe equidade sem ação firme do Estado.
Também precisamos encarar o desafio da valorização docente. O Anuário da Educação Básica 2024, do Todos Pela Educação, mostra que 12,8% dos professores brasileiros não possuem graduação, e apenas 59% dos docentes dos anos finais do fundamental têm formação adequada na disciplina que lecionam. Além disso, os salários seguem desvalorizados: o professor brasileiro recebe, em média, menos da metade do que profissionais de outras áreas com a mesma escolaridade. Como esperar resultados melhores sem reconhecer e valorizar a centralidade do professor?
Outro dado que não pode ser ignorado é o da juventude “nem-nem”: 18,5% dos jovens entre 15 e 29 anos não estudam nem trabalham. Isso significa quase 10 milhões de jovens sem perspectiva de futuro. Precisamos de um ensino médio conectado com o mundo do trabalho, oferecendo formação técnica, estágios e oportunidades reais de inserção produtiva.
O que esses números nos dizem é claro: o Brasil já fez a lição de casa do acesso, mas ainda não venceu o desafio da qualidade. Para mudar esse cenário, precisamos atuar em três frentes: valorização docente, com carreira atrativa e formação permanente; gestão eficiente, com menos burocracia e mais foco na sala de aula; e inovação com qualidade, integrando ensino presencial e digital, mas sem cair na armadilha da massificação precária do EaD.
Estamos investindo, mas não colhendo os frutos esperados. Se quisermos reduzir desigualdades e preparar o país para o futuro, precisamos transformar quantidade em qualidade. A educação é a chave para todos os outros desafios nacionais: da economia à segurança pública, da saúde à própria democracia.
✍️ João Cury
Deputado Federal (MDB-SP) – Membro da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados e Articulista de Educação da São Paulo Tv