
Política Nacional de Humanização do Luto Materno: acolhimento, direitos e dignidade entram em vigor em 90 dias — Gestora de políticas públicas Aline Teixeira e pedagoga Catarina Teixeira analisam a nova legislação
Por Bene Correa e Bia Ciglioni | São Paulo TV Broadcasting
São Paulo, 27 de maio de 2025 – Em um marco inédito na proteção aos direitos das mulheres e famílias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei nº 15.139, que institui a Política Nacional de Humanização do Luto Materno e Parental. Publicada no Diário Oficial da União no dia 26 de maio de 2025, a nova legislação entrará em vigor dentro de 90 dias, garantindo atendimento e acolhimento humanizados às famílias que enfrentam a perda de um filho durante ou após a gestação, integrando essas ações ao Sistema Único de Saúde (SUS).
De acordo com dados do Painel de Monitoramento da Mortalidade Infantil e Fetal, em 2023 o Brasil registrou 20,2 mil mortes infantis e fetais, o menor número desde o início da série histórica, em 1996, quando foram contabilizados mais de 53 mil óbitos — uma redução de 62%. Apesar desse avanço, especialistas apontam que o país ainda carece de políticas públicas que ofereçam suporte emocional e social adequados às famílias enlutadas, o que agora se pretende corrigir com esta nova legislação.
Além disso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que cerca de 10% das gestações no mundo resultam em perdas gestacionais, afetando milhões de mulheres anualmente. No Brasil, segundo estimativas da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), mais de 400 mil mulheres sofrem perdas gestacionais todos os anos, configurando um grave problema de saúde pública.
Diretrizes da nova Política Nacional
A legislação brasileira estabelece garantias fundamentais, tais como:
✅ Apoio psicológico especializado para mães, pais e familiares;
✅ Exames clínicos para investigar a causa do óbito;
✅ Acompanhamento específico em futuras gestações, incluindo suporte psicológico;
✅ Espaços reservados e dignos nos hospitais para pessoas enlutadas, evitando o convívio forçado com mães em situações de parto bem-sucedido;
✅ Atribuição de nome ao natimorto e direito à realização de rituais fúnebres conforme as crenças familiares;
✅ Criação de protocolos clínicos e capacitação das equipes de saúde para um acolhimento adequado;
✅ Encaminhamento para acompanhamento psicológico, preferencialmente na residência da família ou na unidade de saúde mais próxima.
Esses dispositivos visam não apenas oferecer dignidade e respeito, mas também reduzir os riscos de agravamento de quadros emocionais, como depressão e transtorno de estresse pós-traumático.
Análise de especialistas nas áreas de Saúde e Educação: Aline Teixeira, gestora de políticas públicas, e Catarina Teixeira, pedagoga
A São Paulo TV Broadcasting convidou Aline Teixeira, especialista em saúde emocional, direitos das mulheres e gestora de políticas públicas, para analisar a relevância desta política.

Aline enfatiza:
“A Política Nacional de Humanização do Luto Materno é um avanço civilizatório. Não se trata apenas de assegurar direitos legais, mas de reconhecer a dignidade e a subjetividade da mulher que perdeu um filho. A ausência de acolhimento multiplica o trauma, que pode evoluir para quadros graves de depressão, ansiedade e transtorno de estresse pós-traumático.”
A Dra. Aline, além de ser gestora de políticas públicas e estar se graduando em Psicologia, destaca que, como filha e mãe, sua empatia pelas mulheres nessa situação é ainda mais profunda. Ela reforça:
“Dar nome ao natimorto, poder escolher realizar ou não um ritual, ter um espaço reservado e digno são elementos que ajudam a elaborar o luto de forma saudável, sem revitimizar a mulher em um momento de extrema vulnerabilidade.”
Com um trabalho social igualmente dedicado à população, a pedagoga Catarina Teixeira atua na sociedade buscando adequação à realidade das mulheres e trabalha na área da educação humanizada. Catarina considera que o avanço é também educacional e cultural:

“Educar para a empatia e para a escuta é fundamental. Muitas vezes, o sistema de saúde e a sociedade invisibilizam essas perdas, tratando-as como uma estatística, quando, na verdade, há uma família destroçada por trás de cada número.”
O impacto psicológico das perdas gestacionais
Estudos internacionais, como o publicado pela The Lancet, indicam que mulheres que passam por perdas gestacionais sem o devido acolhimento têm até quatro vezes mais risco de desenvolver depressão severa.
No Brasil, levantamento da Fiocruz revelou que cerca de 20% das mulheres que perdem seus bebês não recebem sequer um encaminhamento para atendimento psicológico, ampliando a vulnerabilidade e o risco de adoecimento mental.
Comparativo internacional: como o mundo trata o luto gestacional
A entrada em vigor da política brasileira coloca o país em consonância com as melhores práticas internacionais:
- Reino Unido: o National Health Service (NHS) oferece suporte psicológico especializado, grupos de apoio e protocolos clínicos específicos para perdas perinatais. Além disso, políticas garantem licença maternidade mesmo em casos de perda gestacional.
- Canadá: programas como o Pregnancy and Infant Loss Network (PAIL) oferecem suporte emocional, formação de profissionais e grupos de apoio gratuitos para famílias enlutadas, sendo referência na América do Norte.
- Estados Unidos: organizações como a Postpartum Support International atuam com programas específicos para o luto gestacional e neonatal, além de grupos de apoio e aconselhamento psicológico acessíveis.
- Austrália: o governo oferece suporte através do programa SANDS, que fornece apoio emocional e orientação prática às famílias que perderam bebês durante a gestação ou após o nascimento.
Com a nova política, o Brasil se une a este grupo de nações que entendem o luto gestacional como uma questão de saúde pública e direitos humanos.
Desafios e próximos passos
Embora a legislação represente um avanço significativo, especialistas apontam desafios importantes:
- Capacitação em larga escala de profissionais de saúde;
- Adequação de infraestrutura hospitalar para garantir espaços de acolhimento diferenciados;
- Campanhas de conscientização para combater o estigma social relacionado à perda gestacional e neonatal.
Para Aline Teixeira:
“Precisamos agora garantir que essa lei saia do papel e transforme realidades. As mulheres não podem mais ser invisibilizadas em seus lutos.”
A pedagoga Catarina Teixeira complementa:
“Cada mulher que passar por esse luto merece ser tratada com respeito, acolhimento e humanidade. Isso é mais do que uma obrigação legal, é um dever ético e social.”
Compromisso da São Paulo TV Broadcasting
Como veículo comprometido com os direitos humanos e com a valorização das mulheres, a São Paulo TV Broadcasting continuará acompanhando a implantação dessa política pública, dando voz às famílias e profissionais que atuam na linha de frente deste atendimento tão necessário.
Da redação da São Paulo TV Broadcasting
Bene Correa e Bia Ciglioni
Com informações do Ministério da Saúde, OMS, Fiocruz, Febrasgo, NHS, PAIL, PSI e SANDS.